terça-feira, 14 de maio de 2013

Nhá Chica e Nossa Senhora da Conceição


Uma devoção com quatro conteúdos mariológicos
Por Pe. Rafael Maria, osb*
RECIFE, 13 de Maio de 2013 (Zenit.org) -
No dia 04 de Maio de 2013, foi beatificada a serva de Deus, Francisca de Paula de Jesus, mais conhecida na região sudeste e sul do Brasil como Nhá Chica (1818-1895).
Não desejamos nos alongar aqui na condição escrava em que esta beata viveu, mas no que pode estimular a nossa fé e dedicação à Igreja.
Nos chama atenção em particular que, em Nhá Chica encontramos referimentos mariológicos interessantes, em modo particular em uma oração/novena formulada, segundo dizem, por ela, quando das suas necessidades.
No site http://www.nhachica.org.br/ encontramos esta oração onde se percebe sua profunda devoção a Nossa Senhora da Conceição. Fizemos pequenas correções de sintaxe para a melhor compreensão. O site mencionado possui a aprovação eclesiástica local: «Ó Virgem da Conceição, vós fostes aquela Senhora que entrastes nos céus vestida de sol, calçada de lua, coroada de estrelas, cercada de anjos. 
Vós prometestes ao Anjo Gabriel que havíeis de socorrer a todo aquele que invocasse o vosso santo nome. Agora é a ocasião, valei-me Senhora da Conceição!»
Para se conhecer a profundidade desta oração seria necessário um maior estudo histórico, litúrgico e teológico experimentado por esta filha de escravos. Não basta aqui ressaltar e exaltar a sua condição de mulher pobre, humilde, analfabeta e devota. Existe uma mariologia nata nela que nos revela o «sensus fidelium» (a percepção dos fiéis) nas coisas de Deus, independente da hierarquia eclesial.
Na oração acima descrita encontramos o evocar bíblico-litúrgico quando a beata faz lembrar o texto de Ap 12,1, assim como uma síntese da doutrina mariana. Por ser analfabeta e tendo ouvido o texto apocalíptico da “mulher vestida de sol”, o imaginário da beata se fixou nas ocasiões em que ela participava da liturgia. Embora em nenhuma liturgia mariana antes do século XX se usava o texto do Ap 12,1. Este só viria a ser texto litúrgico de índole mariana na festa da Assunção de Maria depois da proclamação do dogma (1950) por Pio XII.
Na primeira parte da oração (Ó Virgem da Conceição, vós fostes aquela Senhora que entrastes nos céus vestida de sol, calçada de lua, coroada de estrelas, cercada de anjos) denota quatro dogmas marianos: anunciação da Maternidade divina (Anjo Gabriel), Virgindade perpetua (Virgem); dois dogmas a serem definidos: um enquanto ela era viva (1854), pelo papa Pio IX, a Imaculada Conceição (Senhora da Conceição) e o outro, a Assunção de Maria (entrastes no céus) eu estava ainda em reflexão pela Igreja e que só viria a ser proclamado em 1950. Também devemos levar em consideração a ingênua interpretação da beata Francisca com a imagem de Nossa Senhora da Conceição que ela possuía e venerava na sua capela. É uma imagem provavelmente do séc. XVIII, onde a Virgem está de pé, com a lua debaixo dos pés sobre três querubins. A oração em si nos recorda também a passagem bíblica de Ct 6,10: “Quem é essa que avança como a aurora, bela como a lua, resplandecente como o sol…”
A segunda parte da oração (Vós prometestes ao Anjo Gabriel que havíeis de socorrer a todo aquele que invocasse o vosso santo nome) faz menção a uma promessa de Maria… que não tem respaldo bíblico de modo explícito. Mas, de onde Nhá Chica colheu tal informação? Terá intuído da bíblia? Ou, qual foi a influência extra bíblica para compor esta sua oração com promessa?
Ao que parece, e convém dar mais solidez no que dizemos com novas pesquisas, a promessa referida pela beata, segundo nossa percepção, está ligada ao novo nome de Maria dado pelo Anjo: «Cheia de Graça» (Lc 1,26). Sobre o sentido teológico deste novo nome de Maria, procuramos refletir em nosso artigo, cf.http://www.zenit.org/pt/articles/maria-e-a-graca.
A eficácia do nome de Maria é ressaltada por Francisca de Jesus onde ela enfatiza o papel da Virgem na sua intercessão. Invocar o nome da «Cheia de graça», é o mesmo que invocar a «Graça» e desta obter graças. Claro que aqui não é só uma convicção da piedade mariana da beata, mas uma experiência concreta ao longo de sua vida espiritual, pois foi enfatizado na beatificação pelo cardeal Ângelo Amato que, segundo Nhá Chica, “tudo o que pedia à Virgem da Conceição, ela alcançava”. Isto há uma importância enorme para os fiéis, os seus devotos onde, Nhá Chica na sua simplicidade conseguiu conhecer a Virgem Maria em profundidade, na sua ação de servidora e colaboradora na vida de Cristo e da Igreja. Não foi uma piedade alienada, mas vivida, experienciada e o que é mais salutar, aplicada na caridade.
A mariologia contida na prática devocional de Nhá Chica equivale a um aprendizado para nós. Ao longo de uma vida sofrida mas palmilhada pela presença consoladora e estimulante de Maria Imaculada, a Agraciada de Deus.
A confiança na Senhora da Conceição era assim tão forte que Nhá Chica nos transmite e estimula a termos esta mesma confiança na intercessão de Nossa Senhora quando rezava e a imitarmos quando das dificuldades da vida dizendo: «Agora é a ocasião, valei-me Senhora da Conceição!»

*Pe. Rafael Maria é diplomado para "Postulação para Beatificação e Canonização” pela Congregação para Causa dos Santos (Cidade do Vaticano) e doutor em Mariologia pela Pontifícia Faculdade Teológica «MARIANUM» (Roma).  
Leciona atualmente dois cursos: «Básico de Mariologia» e «Cultura Mariológica» via internet, cf. www.cursoscatolicos.com.br
Para maiores informações e comentários:d.rafaelmariaosb@hotmail.com

Fonte: Zenit.org

SAV - Equipe

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